A estreia de Vale Tudo, no dia 30 de abril de 2025, não foi apenas mais um evento televisivo. Foi um marco na história da televisão brasileira. A Globo, que nos últimos anos andava tropeçando entre formatos ousados e experimentações que nem sempre convenciam, decidiu apertar o botão da nostalgia e resgatar um dos maiores clássicos de sua história. O resultado? Uma novela que já nasceu icônica, com a crítica aplaudindo de pé e o público mergulhando de cabeça nesse universo de traições, ambições e moralidade ambígua. Mas a questão que paira no ar é: esse retorno às raízes é um acerto definitivo ou só um brilho efêmero em meio a um cenário midiático em mutação?
MAIS ESSÊNCIA
Chega de tentar imitar os streamings! Essa nova Vale Tudo apostou em um visual que conversa diretamente com o passado: iluminação natural, enquadramentos sóbrios e uma direção que confia no poder do olhar e das palavras.
Ricardo Linhares, diretor artístico da trama, explicou à Veja que a escolha foi proposital: “Queríamos voltar às raízes do melodrama brasileiro, onde a história e os personagens falam mais alto que qualquer efeito especial”. E deu certo. Há algo de quase poético nessa estética mais crua, como se a novela nos puxasse pela mão e nos levasse de volta a uma época em que a TV aberta era o centro das atenções.
Esse visual mais clássico não é apenas um aceno ao passado, mas também uma forma de dialogar com um público que, ao longo das décadas, fez da novela um ritual diário. Afinal, se há algo que a Globo entendeu, é que o Brasil mudou – e o seu espectador fiel envelheceu.
O BRASIL QUE ENVELHECE E A GLOBO QUE SE ADAPTA
Segundo dados do IBGE, em 2025, 15% da população brasileira já passou dos 60 anos. É um dado que diz muito mais do que parece. Significa que boa parte do público dos noveleiros(as) é formada por pessoas que cresceram com esse formato e que agora buscam algo que dialogue com suas memórias. A pesquisadora Ana Cláudia Silva, autora de Televisão e Identidade Nacional, analisa essa tendência: “A Globo aposta no conforto da familiaridade, mas precisa equilibrar isso para não soar ultrapassada”. É um jogo delicado, quase um malabarismo narrativo.
E os números parecem confirmar a eficácia dessa estratégia. A estreia de Vale Tudo marcou 32 pontos no Ibope da Grande São Paulo – um número impressionante, 25% maior do que a média das novelas das 21h nos últimos cinco anos. No Twitter, a hashtag #ValeTudo2025 dominou os trending topics com mais de 500 mil menções em apenas 24 horas.
Mas nem tudo são flores. A audiência mais jovem, que já vê TV aberta com um pé atrás, segue resistente. Como pondera o crítico cultural João Pedro Oliveira: “A Globo caminha em uma corda bamba: precisa honrar sua tradição sem parecer anacrônica”. E aí está o grande desafio.
O FUTURO DA NOSTALGIA
No fim das contas, Vale Tudo é mais do que apenas uma novela: é um termômetro do que a Globo quer ser neste novo Brasil. Ao revisitar uma fórmula consagrada e apostar no talento de um elenco afiado, a emissora tenta reafirmar seu espaço em um mercado cada vez mais fragmentado. Se essa aposta será sustentável a longo prazo, ainda é cedo para dizer. Mas, por enquanto, uma coisa é certa: às vezes, olhar para trás é a melhor forma de seguir em frente.
REFERÊNCIAS
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Projeções populacionais do Brasil: 2020-2060. Rio de Janeiro: IBGE, 2023.
LINHARES, Ricardo. Entrevista concedida a Maria Fernanda Rodrigues. Revista Veja. São Paulo: Editora Abril, ed. 2895, 1º mai. 2025.
OLIVEIRA, João Pedro. Cultura e Mídia no Brasil Contemporâneo. São Paulo: Editora Contexto, 2025.
SILVA, Ana Cláudia. Televisão e Identidade Nacional: O Caso das Telenovelas. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2023.
TV POP. “Bella Campos rouba a cena como vilã em Vale Tudo”. Disponível em: <www.tvpop.com.br/noticias>. Acesso em: 1º mai. 2025.
REDE GLOBO. Site oficial da novela Vale Tudo. Disponível em: <www.globo.com/vale-tudo>. Acesso em: 1º mai. 2025.