Como disse Cazuza, um “museu de grandes novidades”. Essa frase parece definir bem a recente programação do SBT. A emissora, sob o comando de Daniela Beyruti, filha do homem do Baú, Silvio Santos, adotou o slogan “SBT Raiz” em uma tentativa de resgatar a identidade do canal. No entanto, o que se observa é um retorno jocoso a fórmulas antigas, em sua maioria marcadas pela falta de diversidade, pelo sensacionalismo e por uma estética brega e antiquada.
A grade que se apresenta como “nostálgica” insiste no entretenimento raso e na ausência de pautas importantes, especialmente no que se refere à diversidade, reproduzindo a hegemonia branca dos anos 90. Uma lógica que, por muitos anos, fez a televisão brasileira involuir negando o direito de visibilidade a outras vozes e corpos que fogem do padrão dominante.
Essa escolha editorial está diretamente relacionada ao perfil da emissora, que historicamente priorizou conteúdos sensacionalistas. O SBT construiu sua identidade com programas nos quais a sensualidade e o descompromisso com qualquer conteúdo minimamente consequente eram tratados como mecanismos legítimos de audiência. A célebre “Banheira do Gugu”, exibida nos anos 1990, é um exemplo claro de uma lógica televisiva que desconsidera os limites éticos em nome da popularidade.
Além disso, Silvio Santos, frequentemente retratado como gênio da televisão brasileira, também merece ser visto sob outra perspectiva. Parte considerável de sua fortuna foi construída a partir da venda de produtos como Tele Sena e títulos de capitalização, voltados principalmente para públicos de baixa renda, muitas vezes sem o devido esclarecimento sobre os riscos desses investimentos (ORTELLADO, 2016). Assim, a relação entre entretenimento e exploração da vulnerabilidade econômica de seu público não pode ser ignorada.
Nomes como Hebe Camargo, igualmente celebrados na proposta do “SBT Raiz”, também refletem essa construção nefasta: uma socialite adornada de joias e referências conservadoras, sem o mínimo compromisso com pautas significativas. Embora figuras como ela tenham sido importantes na história da televisão, seu legado precisa ser analisado com senso crítico.
O SBT, ao optar por essa “engenharia reversa” de si mesmo, parece confessar sua incapacidade de inovar. Em vez de se abrir ao novo e dialogar com os dilemas da contemporaneidade como a, democratização da mídia, o combate à desinformação e a inclusão, a emissora reafirma valores ultrapassados e uma estrutura de programação que colaboram pouco com a formação crítica da audiência.
Dessa forma, o que resta à empresa “Silvio Santos” é contribuir com um desserviço público, promovendo conteúdos que reforçam estereótipos, enquanto se autoproclama exemplo de bom jornalismo e se autopremia, como ocorreu no último Troféu Imprensa, prêmio que está longe de corresponder à realidade ou a algo de relevância no audiovisual brasileiro. O “SBT Raiz” é, portanto, menos uma homenagem à história da emissora e mais uma prova da paralisia do seu setor criativo.
Referências
MIGUEL, Luiz Felipe. Mídia e política no Brasil: jornalismo e entretenimento no final do século XX. São Paulo: Revan, 2002.
ORTELLADO, Pablo. Mídia, consumo e desinformação: uma análise das estratégias do entretenimento popular. Revista Cult, São Paulo, n. 210, 2016. Disponível em: https://revistacult.uol.com.br/home/midia-consumo-e-desinformacao/. Acesso em: 17 maio 2025.
RAMOS, Janaina. A representação da diversidade na televisão brasileira. Rio de Janeiro: Mauad X, 2019.
