Logo de cara, dá para perceber que o filme é mais sobre a sexualidade do astro do que qualquer outra coisa. Não que isso não seja importante numa biografia, muito pelo contrário, é importantíssimo; afinal, a luta contra a inaceitação do pai dele teve um impacto enorme na sua história, mas acho que Ney Matogrosso é bem mais do que isso. O homem que inspirou a banda Kiss com suas performances pra lá de alucinantes é uma figura quase antagônica na música brasileira, e eu não sei se o filme mostra tudo sobre ele ou se é justamente a simplicidade do roteiro que dá a sensação de que falta algo. Talvez não pudesse ser diferente. E, sim, Ney Matogrosso é, sem dúvida, um dos artistas mais completos vivos no território tupiniquim.
Apesar de pequenas ressalvas, trata-se, sem dúvida, de uma das melhores cinebiografias já lançadas no cinema nacional. Mesmo com um roteiro relativamente previsível, o longa é sustentado por um nome que se destaca em absolutamente todas as cenas: Jesuíta Barbosa.
A atuação de Jesuíta como Ney é digna de prêmios internacionais. Se fosse uma produção hollywoodiana, com certeza estaria em destaque nas manchetes dos principais tabloides e revistas especializadas. Jesuíta não apenas interpreta Ney Matogrosso — ele o incorpora com tanta profundidade, entrega e sensibilidade que, em muitos momentos, o espectador se esquece de que está assistindo a uma representação. Parece realmente que Ney está ali, em carne, osso e alma, cantando, dançando, chorando.
Um ponto interessante, que foge da previsibilidade e acrescenta densidade à narrativa, é a relação conturbada entre Ney e seu pai, intepretado pelo o bom ator Rômulo Braga. Esse recorte mais íntimo e emocional oferece uma dimensão nova ao filme, ajudando a distanciá-lo um pouco do formato comum de biografias lineares.
O filme talvez não consiga dar conta da complexidade e da grandiosidade de Ney Matogrosso — e essa pode ser justamente a prova de sua genialidade. Porque quando um artista ultrapassa as barreiras do tempo, do gênero e do próprio corpo, nenhuma narrativa dá conta de contê-lo por completo. Ainda assim, o que se vê na tela é uma celebração corajosa, intensa e necessária de uma figura única na cultura brasileira.
É um ótimo filme. E digo sem hesitar: Jesuíta Barbosa entrega uma das melhores atuações do cinema brasileiro recente.
