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A Ausência do Espírito • reflexão/poema

Todos se foram, e as ruas agora permanecem desertas, apenas o eco dos animais remexendo o lixo preenche o silêncio. O vento suspira pela melancolia das esquinas. Alguns proclamam ser o crepúsculo do início, outros afirmam ser o fim, pois os dias recentes foram abrasadores.

O sol escaldante, que outrora embelezava o horizonte, hoje inflige castigo. Ainda é meio-dia, mas o tempo parece congelado; observo homens laborando incansavelmente, enquanto gritos de rebeldes desprovidos de discernimento ecoam. Ausentes estão as crianças nas ruas; as pessoas encontram-se enfermas. E eu? Nada além de um zumbi destituído de saudade e coração, vagando na tentativa de extinguir um passado que persiste.

Anseio por fugir, mas a fuga é ilusória! Queria retornar ao passado, mesmo que fosse em devaneios, mesmo que fosse por um fugaz momento, para testemunhar como esta terra era outrora. Desejaria percorrer essas ruas e contemplar flores, viver sonhos, existir sem temores, sem preocupações. Ah, se ao menos pudesse retroceder no tempo, mesmo que por um instante, para te encontrar.

Apesar de tudo, preservo os ensinamentos de meu pai. Recordo-me daquele dia em que ele profetizava a chegada desta época. Que infortúnio! Este é o meu tempo, este é o meu lar. Nasci em uma era que impõe castigos, sem ter solicitado tal fado. Meu pai afirmava que se o espírito estivesse presente, tudo seria diferente. Jamais vi esse tal espírito, não o conheço, mas, ao ouvir falar tanto sobre ele, já me flagrei sentindo sua falta. Meu pai dizia que somente ele possuía o poder de reacender o amor nas pessoas, e é por esse espírito que renunciamos aos privilégios, por esse espírito sofremos, por esse espírito morremos e vivemos a cada dia.

Sinto até raiva; por que não pude nascer em outra era? Se um dia esse espírito retornar, desejo fazer-lhe diversas perguntas. Se ele é tão perfeito como meu pai alegava, por que apenas os antigos puderam percebê-lo? Tudo era melhor naquela época, mas ele se dissipou, e nada mais resta a fazer.

Anseio por conhecer a tua música; sinto falta daqueles que desapareceram. Os dias são abrasadores, quase nenhum ser humano à vista. Aguardo impacientemente, meu pai dizia que, apesar de tudo, teríamos uma chance. Mesmo sem conhecê-lo, imploro por sua ajuda, sinto sua falta, assim como esta terra seca anseia pela chuva.

Por Fagner Carvalho

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